Maria Stella de Azevedo Santos- Iyalorixá do Ilê Axé Opô Afonjá |
A minha função espiritual faz de mim uma intermediária
entre o humano e o sagrado e para exercê-la da melhor maneira possível tenho
como instrumento o Jogo de Búzios. Pessoas de diferentes idades, raças e até
mesmo credos, buscam a ajuda desse oráculo. Surpreende-me o fato de que uma
grande parte dos que me procuram sente-se vítimas de inveja.
Engraçado é que nunca, nem um só dia sequer, alguém
chegou pedindo-me ajuda para se libertar da inveja que sentia dos outros. Será
que só existem invejados? Onde estarão os invejosos? E o pior é quando consulto
o oráculo e ele me diz que os problemas apresentados não são decorrentes de
inveja, a pessoa fica enfurecida.
Percebo logo que existe ali uma profunda insegurança, que
gera uma necessidade de autovalorização. Se isso ocorresse apenas algumas
vezes, menos mal, o problema é que esse comportamento é uma constante. Isso me
leva a pensar que cada pessoa precisa olhar dentro de si, tentar perceber em
que grau a inveja existe dentro dela, para assim buscar controlar e emanar este
sentimento, de modo que ela não venha a atuar de maneira prejudicial ao outro,
mas principalmente a si, pois qualquer energia que emitimos, reflete primeiro
em nós mesmos.
Uma fábula sobre a inveja serve para
nossa reflexão: Uma cobra deu para perseguir um vagalume, cuja única atividade
era brilhar. Muito trabalho deu o animalzinho brilhante à insistente cobra, que
não desistia de seu intento. Já exausto de tanto fugir e sem possuir mais
forças o vagalume parou e disse à cobra: – Posso fazer três perguntas? Relutante
a cobra respondeu: – Não costumo conversar com quem vou destruir, mas vou abrir
um precedente. O vagalume então perguntou: -Pertenço à sua cadeia alimentar?-
Não, respondeu a cobra. – Fiz algum mal a você-?- Não, continuou respondendo a
cobra.- Então por que me persegue?- perplexo, perguntou o brilhante inseto. A
cobra respondeu: – Porque não suporto ver você brilhar, seu brilho me incomoda.
Ingênuas as pessoas que pensam que o brilho do outro tem
o poder de ofuscar o seu. Cada um possui seu brilho próprio, que deve estar de
acordo com sua função. Existem até pessoas cujas funções requerem simplicidade,
onde o brilho natural só é percebido através do reflexo do olhar do outro.
Lembro-me de uma garotinha de apenas 10 anos de idade que
a mãe me procurou para ajudá-la, pois ela ficava furiosa quando não tirava nota
dez na escola. Comportamento que fazia com que seus coleguinhas se afastassem
dela. Algumas tardes eu passei conversando com a garota. Um dia ela chegou me
dizendo que não aparesentava mais o referido problema, que até tirou nota dois
e não se incomodou.
Fiquei muito feliz, cheguei mesmo a ficar vaidosa, pois
acreditei que aquela nova atitude era resultado de nossas conversas. Foi quando
ela me disse:- Sabe por que não me incomodei de tirar nota dois, Mãe Stella?
Ansiosa, perguntei:- Por que? Ao que ela me respondeu: – Porque o resto da
turma tirou nota um. Rimos juntas da minha pretensa sabedoria de conselheira e
do natural instinto de vaidade que ela possuía e que muito trabalho teria para
domá-lo. O desejo que a garota possuía de brilhar mais do que os outros, com
certeza atrairia para ela muitos problemas. Afinal, ela não queria ser sábia,
ela queria ser vista.
O caso contado anteriormente fez lembrar-me de outro que
eu presenciei, onde uma senhora repleta de ouro insistia em me dizer que as
pessoas estavam olhando para ela com inveja. Cansada daquele queixume,
disse-lhe que quem não quer ser visto, não se mostra.
A inveja é popularmente conhecida com
olho gordo. Se não queremos ser atingidos pelo olho gordo do outro, devemos
cuidar para que que nossos olhos emagreçam, não deixando que eles cresçam com o
desejo de possuir o alheio. Já que fazemos dieta para nossos corpos serem
saudáveis, devemos também fazer dieta para nossos olhos, pois eles refletem a
beleza da alma. A tendência agora é, portanto, olhos magrinhos, mas não
anoréxicos, pois alguns desejos eles precisam ter, de preferência desejos
saudáveis.
Maria Stella de
Azevedo Santos é Iyalorixá do Ilê Axé Opô Afonjá. Fonte Imagem: Mãe Stella
faz uma bela reflexão sobre a inveja. Foto: Diego Mascarenhas / Ag. A TARDE/
09.07.2010
Fonte: Mundo Afro
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