Boas Vindas!!

MOJUBÁ !
Temos o intuito de incentivar e discultir textos sobre as religiões de matriz africana entre outras questões que envolve essa temática, também ter um espaço para divulgação da atividades da Egbé que alcança o Ilê Axé Sangó e o Centro Cultural Ébano Brasil.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

ENTRE TER SONHOS E VIVER SONHANDO


Babàloòrisá João Bosco D’ Sangò
Neste plano existem seres humanos que preferem viver sonhando a correr para realizar seus sonhos. Negar que sonhar é maravilhoso seria incoerência, porém apenas sonhar se torna profundamente vão. Partindo desse pressuposto, gostaria de lembrar a frase de uma personalidade da história recente dos EUA, que fez da sua vida um ideal de busca e luta por dignidade humana dos afronorteamericanos, refere-se a Martim Luther King Jr, assassinato em nome de seus ideais no dia 04 de abril de 1968, seu discurso mais famoso se intitula de “Eu tenho um Sonho”(citado na integra mais abaixo).
O sonho de viver em uma sociedade onde o respeito a nós religiosos/as de matriz africana deve ser nosso ideal de vida e luta. Sem, contudo ser extremista e achar que só as religiões de matriz afro têm a verdade absoluta, diga-se de passagem, neste mundo tudo é relativo. Porém, em nosso cotidiano de religiosos/as colocar esse ideal como meta primordial deve fazer parte de nossos sonhos e ideais de vida.

  Destaques:


                             Odia 07 de abril é assinalado como Dia Mundial da Saúde, momento oportuno para discutir nas Egbés, Ilés Asés e Terreiros sobre a saúde da população negra em geral e a saúde dos praticantes de religião dos Orisás em especial. Destacando a anemia falciforme e hiper tensão, entre outras doenças, por serem as mais comuns entre os afrodescendentes. Para tanto o Centro Cultural Ébano Brasil e a Egbé Oní Omorisá Sangò, através deste blog deseja contribuir com tais debates. Por esse aspecto o artigo da professora Ângela Maria B. Bahia de Brito (UFA) intitulado Saúde da população negra e religiões afrobrasileiras traz a baila esse tema.


Babàloorisá Edson Fernandes D’Odé
  Este mês também é marcado pelo nascimento do Babàloorisá Edson Fernandes D’Odé, dia 08/04, sacerdote e líder da Egbé Oní Omórisá Odé, que tem sua sede no município de Campo Grande-MS. Pai Edson, nosso Babàloorisá, é uma pessoa que tem contribuído grandemente para consolidação do Candomblé Ketù na região Centro Oeste. É uma pessoa de grande conhecimento acerca da religião, além de ser defensor árduo das mais variadas manifestações religiosas de matriz africana.
Ele é um Babàloorisá sempre disposto a ajudar e orientar a todas as pessoas que procuram a religião e, principalmente, a nós seus filhos de santo. Por isso, e por inúmeras atitudes dele é que deixamos aqui o ‘nosso muito obrigado’, além de desejarmos muita paz, sucesso, sabedoria, luz, vida longa e muito asé. Que Babá Orisá Odé sempre lhe cubra de alegrias, harmonia e fartura de felicidade!!!!

                                  Merece destaque ainda o dia 19 como dia Mundial da Juventude. Que as egbés e ilês asé estejam sempre de braços abertos a receber, acolher e educar os/as jovens que nos procuram nos valores religiosos afrobrasileiro. Já que, bem acolhidos e orientados dentro da religião dos Orisás, certamente essa força juvenil se tornarão protagonistas e certamente darão continuidade à tradição religiosa africana presente em todos os rincões deste país.

Iandra D´osun


                          O dia 24 de abril e o aniversario de nascimento da Yaô Iandra Morais D’ Osun, Hungbona da Egbé Oní Omorisá Sangó. Todos/as desta egbé alegra-se com esta data, pois Babá Orisá Sangó trouxe para esta Ilê Asé a sua filha dileta. E todos/as sentimos felizes com essa data. E, pedimos a Babá Olodumare, toda sua corte de Orisá, especialmente Ya Osun que de a nossa hungbona de vida longa com saúde, harmonia, paz de espírito, sucesso nos estudos, amor e em sua vida profissional. Que você Iandra a cada dia de sua vida tenha mais conhecimentos e sabedoria no trato com as coisas dos Orisás. Chuva de felicidades, alegria e muito asé é o te desejamos. Seja sempre muito feliz.

                      A lenda escolhida para este mês (abaixo) intitulada A pior e a melhor coisa do mundo leva-nos a pensar acerca de nossas atitudes corriqueiras. Ela sempre servirá como reflexão para cada um de nós em nosso cotidiano.
                  Postou-se por fim o discurso completo do religioso e ativista negro Martim Luther King Jr com objetivo de refletirmos sobre a realidade por ele vivida e sonhada.

        Enfatizamos o Calendário de Atividades do mês de abril da Egbé Oní Omó Orisá Sangó:
 
Dia – 02Sábado (Das 15 às 17 horas) Atendimento Público;
 
Dia – 06 - Quarta Feira (20 horas) Amalá;
 
Dia – 09Sábado (Das 15 às 17 horas) Projeto Discutindo Candomblé: Roda de conversa e debate sobre a dinâmica do Candomblé Ketu no Brasil;
 
Dia – 16 – Sábado - Participação dos Festejos de Ogum e Ode na Egbé Óní Ode- Campo Grande-MS;
 
Dia – 23 – Sábado (Das 15 às 17 horas) - Projeto Discutindo Candomblé: Roda de conversa e debate sobre a dinâmica do Candomblé Ketu no Brasil;
 
Dia – 24Domingo – Reunião Mensal e Almoço de Confraternização.

 
         Esperamos que os escritos deste mês contribuam minimamente com o processo de formação e conscientização de todos/as aqueles/as que disponibilizarem um pouco de seu tempo para dedicar à leitura deste meio de comunicação.
Boa Leitura e um ótimo mês a todos/as.

SAÚDE DAPOPULAÇÃO NEGRA E RELIGIÕES AFROBRASILEIRAS

Ângela Maria B. Bahia de Brito1
O campo estabelecido como saúde da população negra no Brasil é e tem sido uma novidade definida nas duas últimas décadas por nós mesmos, a população negra, principalmente pelos militantes do Movimento Negro e pelos profissionais de saúde, destacando-se aí as mulheres negras. Trata-se de uma operação estratégica de revelar o oculto de um campo vital para a sobrevivência de uma parcela numericamente importante da população brasileira. A criação deste conceito incorpora elementos de diversas áreas de conhecimento inter e transdisciplinar e vários condicionantes, ampliando para além da biologia e da medicina, as possibilidades de leitura da gênese dos processos de saúde – doença junto à população negra e toda a população brasileira.
Elementos tão diferentes quanto a poluição ambiental, as oportunidades de emprego e a religião fazem parte do que, em epidemiologia, chamamos de determinantes do processo saúde-doença. Quando somamos as condições de vida (condicionantes sociais) às características herdadas pelos indivíduos dos seus antepassados (condicionantes genéticos), temos um perfil particular de doenças. Assim, a particularidade desta “soma de condicionantes” determinam as doenças prevalentes na população negra brasileira.
Reconhece-se, então, a necessidade de explicar um campo específico de ação em saúde voltada para a população negra, sinalizando, também, para a área de saúde da mulher negra como viés necessário.
As doenças em mulheres negras e suas repercussões sobre saúde reprodutiva e mortalidade materna devem-se, provavelmente, a um emaranhado de condições geneticamente determinadas, que levam a hipertensão/DHEG (Doença Hipertensiva Especifica da Gravidez) como principal causa de óbitos no país, mas que também contribuem significativamente nas demais causas de óbitos maternos, sejam diretas
(infecção, aborto e outras) ou indiretas (acidente vascular cerebral, cardiopatias, diabetes, doenças renais e outras). Além disso, é necessário considerar as condições de vida e o acesso dessas mulheres à saúde. Para Berg et al.(1996) os “esforços para reduzir a mortalidade materna deveriam incluir as mulheres negras como um grupo de risco”. Raça é um conceito biológico. A aplicabilidade do conceito raça à saúde tem provocado debates tanto no campo científico quando fora dele. Sabemos da aplicabilidade da raça ou cor no que se refere à morbi-mortalidade por um variado conjunto de agravos à saúde, tanto aqueles vinculados à variabilidade genética quanto aos modos de vida. Já se encontram descritos na literatura científica de saúde, tanto no país, quanto no exterior, diferentes agravos à saúde de grupos ou populações específicas, não apenas de negros e negras. Historicamente, os significados sociais, as crenças e atitudes sobre os grupos raciais, especialmente o negro, têm sido traduzidos em políticas que limitam oportunidades e expectativa de vida.
A inserção social desqualificada e desvalorizada da população negra brasileira e a invisibilidade de suas necessidades específicas - nas ações e programas de promoção à saúde, atenção e prevenção de agravos – adicionados ao estado defensivo assumido por mulheres e homens negros no dia-a-dia (necessidade de integrar-se e, ao mesmo tempo, de defender-se dos efeitos nocivos da discriminação e do preconceito), podem provocar comportamentos inadequados, doenças psíquicas e psicossociais, além das doenças físicas.
Em todas os cantos do mundo a eficácia do cuidado em saúde varia de acordo com as condições sócioeconômicas (e seus efeitos) do sujeito – o lugar onde ele vive, a qualidade dos equipamentos sociais aos quais tem acesso, a sensibilidade, humanização e o compromisso da equipe de profissionais pelas quais ele(a) é atendido(a). Em decorrência dessas premissas, o registro e a análise das desigualdades e iniqüidades raciais em saúde só devem ser feitos por pessoas sensíveis e aptas a compreenderem os diferentes sentidos e significados atribuídos às relações entre negros e não negros, entre homens e mulheres, entre jovens e idosos.
A existência do quesito “cor” nos documentos oficiais é o primeiro passo para a redução das desigualdades. O contingente de mulheres negras é ignorado pelo sistema de saúde na sua especificidade (em conseqüência do mito da democracia racial presente em toda a população). Mas a informação é indispensável para que possam ser avaliadas as condições de saúde da mulher no Brasil.
É necessário também o treinamento dos profissionais de saúde sobre a importância dos dados e, mais efetivamente, treinamento e sensibilização referente à raça, cor e etnia.
Aqueles que precisam de cuidados buscam um esquema de atendimento que:
1) Considere suas necessidades em saúde;
2) Seja conveniente ao seu perfil sócio-econômico;
3) Leve em consideração sua posição na hierarquia social e de gênero, dentro e fora da unidade familiar, e também suas crenças, seus valores e expectativas.
A dificuldade enfrentada pelos cuidadores em contemplar esta diversidade e pluralidade compromete a eficiência e eficácia de suas ações. O racismo tem sido um fator determinante dos modos de nascer e morrer da população brasileira, com índices visivelmente piores para a população negra, afetando seu acesso a bens sociais como saneamento básico, alimentação balanceada, habitação social, traduzindo-se em maior mortalidade infantil e materna e menor esperança de vida.
Influencia, também, a progressão de doenças, grande parte delas evitáveis, mas que não tem recebido a devida atenção das políticas públicas. Cólera, dengue, sarampo, meningite meningocócica, esquistossomose, doença de Chagas, malária, diarréia, DST/HIV/AIDS, quando somos sabedores que quanto maior o grau de vulnerabilidade social de indivíduos e grupos, tanto maior sua vulnerabilidade a infecção e epidemias. Em relação à hipertensão arterial, diabetes tipo II e outras, a evolução mais grave ocorre entre a população negra. Assim, as propostas de saúde da população negra requerem ações emergenciais que busquem fundamentalmente romper com as desigualdades raciais e sociais no Brasil, o que implica atuar em diversas áreas, buscando: 1) ampliação da escolaridade dos negros brasileiros; 2) melhoria das condições habitacionais tanto no campo quanto na cidade; 3) acesso ao trabalho e a melhores níveis de remuneração; 4) diminuição dos índices de violência e da criminalidade no interior das comunidades negras e pobres; 5) ampliação do acesso à justiça, entre tantos outros em áreas igualmente críticas. Como, também, ações voltadas para políticas de saúde que visem a ampliação do acesso aos serviços de prevenção e tratamento, o que significa melhorias quantitativa e qualitativa no atendimento, incluindo, ainda, a redução dos índices de mortalidade infantil, morte violenta e morte materna, que permanecem com os mais altos índices entre os da raça negra.
Portanto, a formulação de uma Política Nacional de Saúde da População Negra buscaria romper um dos elos que garante a persistência dessa situação, reconhecendo, por um lado, a forma dinâmica da contribuição da sabedoria da medicina popular e das manifestações culturais e artísticas afro-brasileiras para a promoção do bem-estar físico, psíquico e social da população. Por intermédio de categorias culturais que permitem outras formas de perceber, expressar, avaliar e tratar doenças, terapeutas populares como mães-de-santo, benzedeiras, rezadeiras, raizeiras e parteiras, atendem a uma demanda expressiva de doentes que não têm acesso aos serviços públicos de saúde e, costumam ser, para muitos, talvez, a única forma terapêutica disponível.
A função de rezadeira é exercida, primordialmente, pelas mulheres. Ela precisa conhecer, não somente o repertório de rezas, cantos e fórmulas, como também, os detalhes posturais adequados, tanto os seus quanto os dos participantes, uma vez que lhe cabe instruí-los e zelar para que as técnicas rituais sejam corretamente mantidas e atualizadas na prática.
Para nascer, para morrer, para louvar os santos e antepassados, para selar promessas e desmanchá-las, há rezas e cantos específicos, configurando uma posição e uma função social especializada e de prestígio.
Outra posição relevante é a de benzedeira, que cura certos males com “rituais” de benzenção ou com plantas, ou que tira e põe o feitiço. A benzedeira pode ser especialista em apenas algumas dessas modalidades, ou em duas, ou mesmo em todas, dependendo de sua aptidão, treinamento e do poder do mestre de sua “força”. Também essa posição era restrita aos homens, mas a morte de grandes mestres, sem que transmitissem seus saberes a um sucessor, bem como as mudanças estruturais no processo de produção, levaram a uma fragmentação do conhecimento e ao desdobramento da especialidade.
Atualmente, a benzedeira competente benze dor de dente, quebranto, vento virado, espinhela caída. Há as benzedeiras que benzem roças para livrá-las das pragas, benzem feridas, bicheiras. De modo geral, a “benzenção” envolve reza ou recitação de fórmulas acompanhadas de gestos adequados com galhos igualmente apropriados ao
tipo do mal, devendo, portanto, ser jogado na água corrente (que tem o poder de “rodar” o mal) ou em direção ao sol poente (que tem o poder de carregar o mal), ou então queimado (pois o fogo tem o poder de consumir o mal).
A crença no feitiço é restrita, embora esteja escamoteada. Os mais velhos lamentam o declínio do poder dos especialistas e que a comunidade tenha perdido sua “força”, atualmente fragmentada.
A linguagem oral é responsável pela transmissão dos “casos” de doenças ocorridas e a intervenção “sábia” dessas mulheres no processo de cura. Algumas pesquisas mostram o trabalho, as “obrigações” diárias, impregnadas de caráter lúdico. Parece não haver, no cotidiano, a divisão de tempo entre trabalho e lazer.
O ritmo de vida é diferente, e aspectos como “manifestações culturais”, organização política e religiosidade não fazem muito sentido quando vistos de forma compartimentada. Às vezes, essa interligação de atividade aponta para características de uma sociedade em que os elementos da modernidade não estão presentes, outras vezes, aponta para as contradições visíveis em nossa sociedade. “Os terreiros de candomblé são equipamentos de saúde, pois muitas pessoas, ao sentir algo, recorrem em primeiro lugar aos terreiros. Assim, torna-se necessário que estejam preparados para passar informações adequadas e seguras, além de encaminhá-las ao serviço de saúde. Dessa forma eles se transformam em um espaço especial para o trabalho de conscientização sobre saúde”, afirma Anselmo Santos, no V Seminário Nacional de Candomblé, Saúde e Axé, realizado em Salvador. Formando uma estrutura que marca de forma significativa a cultura brasileira, mais de 30.000 terreiros espalhados pelo país constituem as diversas expressões das religiões de matrizes africanas no Brasil. Esses espaços sagrados possuem características próprias, de acordo com sua origem geográfica e interação com diferentes grupos étnicos.
Por meio de suas práticas rituais e de sua visão de mundo integradora, estas religiões possibilitam a inclusão de grande parcela da população, que encontra nos terreiros ou casa de santo a possibilidade de vivenciar relações humanas espirituais em um espaço de acolhimento e solidariedade.
A força advinda dos deuses e deusas para lidar com a saúde, seja do ponto de vista da promoção, prevenção, dos tratamentos ou curas, pode ser ilustrada pelo mito de Ossaim - guardião dos segredos das folhas. Muitas vezes, o acontecimento ou experiência, entendidos na lógica da medicina oficial, como distúrbios do corpo físico e/ou da mente, são, para as religiões de matrizes africanas, sinais ou manifestações de espiritualidade.
Os/as iniciadas crêem no poder da terapêutica dos terreiros exercida por pais e mães-de-santo diante de diversas situações de adoecimento ou desequilíbrio. Operando com riquíssima simbologia, esta terapêutica está contida nos rituais, nas folhas, nos banhos, na comida de santo e nos ebós (despachos).
Se por um lado é fundamental que o povo de santo conte com a medicina tradicional, por outro é essencial que a medicina oficial reconheça e considere a capacidade de intervenção, aconselhamento e acolhimento da medicina exercida nos terreiros.
1 Meteorologista, com graduação na Universidade Federal do Rio de Janeiro; professora de Biometeorologia da Universidade Federal de Alagoas; especialização em Ecologia e Ciências do Ambiente. Militante do Movimento Negro.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS PARA ESTE TEXTO
ALVES, Amaro e Barbosa, Romero Bezerra. A Saúde da População Negra – realizações e perspectivas. Mimeo, 1998.
BARBOSA, Maria Inês da Silva. “É mulher, mas é negra: perfil da mortalidade do quarto de despejo”. Jornal da Rede. N°23, março de 2001.
BERG, C.J; ATRASH, H.K.et al. Pregnancy-Related mortality in the United States, 1987-1990. Obstetrics Gynecology. V.88, Nº 2, pp.161-167, August, 1996.
Conselho Nacional de Saúde. “Resolução nº 196/96 sobre ética em pesquisa com seres Humanos”.
Manual de Doenças mais Importantes por Razões Étnicas na População Brasileira Afrodescendente. Ministério da Saúde /Universidade de Brasília, 2000, pp.65-67.
Organização Pan Americana da Saúde. Relatório sobre a Saúde no Mundo. Saúde Mental: nova concepção, nova esperança. OPAS/OMS, 2001, pp. 40-41.
Portaria G/M nº 822 de 6 de junho de 2001”. Programa Nacional de Triagem Neonatal/PNTN.
ZAGO, Marco Antonio. “Problemas de Saúde das Populações Negras no Brasil. O papel da anemia falciforme e de outras doenças genéticas”. Texto apresentado na Mesa Redonda sobre Saúde da População Negra. Brasília, abril 1996.


LENDA DO MÊS:

 A PIOR E A MELHOR COISA DO MUNDO
 
Quando Obatalá chegou neste mundo, nada conhecia sobre ele e tinha curiosidade de saber de todas as coisas. Foi por este motivo que um dia pediu a Esu, que era seu empregado, que lhe servisse no almoço aquilo que houvesse de melhor sobre a face da Terra.
Esu então foi ao mercado e ali comprou uma língua bovina que, com as próprias mãos, limpou, temperou e, depois de assar, serviu a Obatalá.
Finda a refeição, muito agradecido, Obatalá disse a Esu:
O prato que me serviste é realmente delicioso; jamais, em minha vida, experimentei algo tão bom!
Envaidecido, Esu retrucou:
Realmente, a melhor coisa do mundo é a língua!
Quero agora, amigo Esu, que me sirvas a pior coisa que possa existir neste mundo – pediu o Orisá Funfun.
No dia seguinte, Esu foi novamente ao mercado, onde retornou com mais uma língua bovina. Novamente preparou-a da mesma forma que a anterior e serviu-a a seu amo.
Depois de comer, Obatalá repreendeu Esu:
Quer me parecer que não entendeste bem meu pedido. Ontem me serviste uma língua como sendo a melhor coisa do mundo, comi e gostei, aprovando inteiramente a tua escolha. Em seguida te pedi que me servisses, hoje, a pior coisa do mundo e, mais uma vez me serves língua. O sabor é exatamente o mesmo da que me foi servida ontem e gostaria de saber como pode uma coisa ser, ao mesmo tempo, a melhor e a pior coisa do mundo. Ou será que se trata de tuas brincadeiras?
Não, Grande Ori, não se trata de nenhuma brincadeira. Jamais agi com tanta seriedade e segurança! – assegurou Esu.
Explica-me então o que pretendes pois, confesso, não consigo entender onde queres chegar – replicou o Orisá Funfun.
Com ar sério, Esu começou a explicou:
A língua é, sem dúvida, a melhor coisa do mundo e, contraditoriamente, pode ser a mais perigosa e ruim de todas.
Quando é usada para coisas boas tais como abençoar, fazer preces em louvor aos Orisás, orientar corretamente, cantar a boa música, recitar poesias, falar de amor e ensinar os bons costumes é, então , a melhor coisa do mundo.
Quando, ao contrário, é utilizada para caluniar, amaldiçoar, mentir, fomentar a discórdia e a guerra, torna-se letal. É a pior de todas as invenções do nosso Pai Olodumàre e melhor seria que nunca tivesse existido.
Tudo depende da forma como é usada por seu dono, para que possa ser classificada como a melhor ou a pior coisa do mundo.
E foi então que Obatalá, compreendendo o ensinamento que lhe dera Esu, nunca mais aceitou língua em suas refeições.
  (MARTINS, Adilson. Lendas de Exu. Pallas: 2008. p. 37-38)

EU TENHO UM SONHO

Discurso de Martin Luther King (28/08/1963)
“Eu estou contente em unir-me com vocês no dia que entrará para a história como a maior demonstração pela liberdade na história de nossa nação.
Cem anos atrás, um grande americano, na qual estamos sob sua simbólica sombra, assinou a Proclamação de Emancipação. Esse importante decreto veio como um grande farol de esperança para milhões de escravos negros que tinham murchados nas chamas da injustiça. Ele veio como uma alvorada para terminar a longa noite de seus cativeiros.
Mas cem anos depois, o Negro ainda não é livre.
Cem anos depois, a vida do Negro ainda é tristemente inválida pelas algemas da segregação e as cadeias de discriminação.
Cem anos depois, o Negro vive em uma ilha só de pobreza no meio de um vasto oceano de prosperidade material. Cem anos depois, o Negro ainda adoece nos cantos da sociedade americana e se encontram exilados em sua própria terra. Assim, nós viemos aqui hoje para dramatizar sua vergonhosa condição.
De certo modo, nós viemos à capital de nossa nação para trocar um cheque. Quando os arquitetos de nossa república escreveram as magníficas palavras da Constituição e a Declaração da Independência, eles estavam assinando uma nota promissória para a qual todo americano seria seu herdeiro. Esta nota era uma promessa que todos os homens, sim, os homens negros, como também os homens brancos, teriam garantidos os direitos inalienáveis de vida, liberdade e a busca da felicidade. Hoje é óbvio que aquela América não apresentou esta nota promissória. Em vez de honrar esta obrigação sagrada, a América deu para o povo negro um cheque sem fundo, um cheque que voltou marcado com “fundos insuficientes”.
Mas nós nos recusamos a acreditar que o banco da justiça é falível. Nós nos recusamos a acreditar que há capitais insuficientes de oportunidade nesta nação. Assim nós viemos trocar este cheque, um cheque que nos dará o direito de reclamar as riquezas de liberdade e a segurança da justiça.
Nós também viemos para recordar à América dessa cruel urgência. Este não é o momento para descansar no luxo refrescante ou tomar o remédio tranqüilizante do gradualismo.
Agora é o tempo para transformar em realidade as promessas de democracia. Agora é o tempo para subir do vale das trevas da segregação ao caminho iluminado pelo sol da justiça racial. Agora é o tempo para erguer nossa nação das areias movediças da injustiça racial para a pedra sólida da fraternidade. Agora é o tempo para fazer da justiça uma realidade para todos os filhos de Deus.
Seria fatal para a nação negligenciar a urgência desse momento. Este verão sufocante do legítimo descontentamento dos Negros não passará até termos um renovador outono de liberdade e igualdade. Este ano de 1963 não é um fim, mas um começo. Esses que esperam que o Negro agora estará contente, terão um violento despertar se a nação votar aos negócios de sempre.
Mas há algo que eu tenho que dizer ao meu povo que se dirige ao portal que conduz ao palácio da justiça. No processo de conquistar nosso legítimo direito, nós não devemos ser culpados de ações de injustiças. Não vamos satisfazer nossa sede de liberdade bebendo da xícara da amargura e do ódio. Nós sempre temos que conduzir nossa luta num alto nível de dignidade e disciplina. Nós não devemos permitir que nosso criativo protesto se degenere em violência física. Novamente e novamente nós temos que subir às majestosas alturas da reunião da força física com a força de alma. Nossa nova e maravilhosa combatividade mostrou à comunidade negra que não devemos ter uma desconfiança para com todas as pessoas brancas, para muitos de nossos irmãos brancos, como comprovamos pela presença deles aqui hoje, vieram entender que o destino deles é amarrado ao nosso destino. Eles vieram perceber que a liberdade deles é ligada indissoluvelmente a nossa liberdade. Nós não podemos caminhar só.
E como nós caminhamos, nós temos que fazer a promessa que nós sempre marcharemos à frente. Nós não podemos retroceder. Há esses que estão perguntando para os devotos dos direitos civis, “Quando vocês estarão satisfeitos?”
Nós nunca estaremos satisfeitos enquanto o Negro for vítima dos horrores indizíveis da brutalidade policial. Nós nunca estaremos satisfeitos enquanto nossos corpos, pesados com a fadiga da viagem, não poderem ter hospedagem nos motéis das estradas e os hotéis das cidades. Nós não estaremos satisfeitos enquanto um Negro não puder votar no Mississipi e um Negro em Nova Iorque acreditar que ele não tem motivo para votar. Não, não, nós não estamos satisfeitos e nós não estaremos satisfeitos até que a justiça e a retidão rolem abaixo como águas de uma poderosa correnteza.
Eu não esqueci que alguns de você vieram até aqui após grandes testes e sofrimentos. Alguns de você vieram recentemente de celas estreitas das prisões. Alguns de vocês vieram de áreas onde sua busca pela liberdade lhe deixaram marcas pelas tempestades das perseguições e pelos ventos de brutalidade policial. Vocês são o veteranos do sofrimento. Continuem trabalhando com a fé que sofrimento imerecido é redentor.
Voltem para o Mississippi, voltem para o Alabama, voltem para a Carolina do Sul, voltem para a Geórgia, voltem para Louisiana, voltem para as ruas sujas e guetos de nossas cidades do norte, sabendo que de alguma maneira esta situação pode e será mudada. Não se deixe caiar no vale de desespero.
Eu digo a você hoje, meus amigos, que embora nós enfrentemos as dificuldades de hoje e amanhã. Eu ainda tenho um sonho. É um sonho profundamente enraizado no sonho americano.
Eu tenho um sonho que um dia esta nação se levantará e viverá o verdadeiro significado de sua crença – nós celebraremos estas verdades e elas serão claras para todos, que os homens são criados iguais.
Eu tenho um sonho que um dia nas colinas vermelhas da Geórgia os filhos dos descendentes de escravos e os filhos dos desdentes dos donos de escravos poderão se sentar junto à mesa da fraternidade.
Eu tenho um sonho que um dia, até mesmo no estado de Mississippi, um estado que transpira com o calor da injustiça, que transpira com o calor de opressão, será transformado em um oásis de liberdade e justiça.
Eu tenho um sonho que minhas quatro pequenas crianças vão um dia viver em uma nação onde elas não serão julgadas pela cor da pele, mas pelo conteúdo de seu caráter. Eu tenho um sonho hoje!
Eu tenho um sonho que um dia, no Alabama, com seus racistas malignos, com seu governador que tem os lábios gotejando palavras de intervenção e negação; nesse justo dia no Alabama meninos negros e meninas negras poderão unir as mãos com meninos brancos e meninas brancas como irmãs e irmãos. Eu tenho um sonho hoje!
Eu tenho um sonho que um dia todo vale será exaltado, e todas as colinas e montanhas virão abaixo, os lugares ásperos serão aplainados e os lugares tortuosos serão endireitados e a glória do Senhor será revelada e toda a carne estará junta.
Esta é nossa esperança. Esta é a fé com que regressarei para o Sul. Com esta fé nós poderemos cortar da montanha do desespero uma pedra de esperança. Com esta fé nós poderemos transformar as discórdias estridentes de nossa nação em uma bela sinfonia de fraternidade. Com esta fé nós poderemos trabalhar juntos, rezar juntos, lutar juntos, para ir encarcerar juntos, defender liberdade juntos, e quem sabe nós seremos um dia livre. Este será o dia, este será o dia quando todas as crianças de Deus poderão cantar com um novo significado.
“Meu país, doce terra de liberdade, eu te canto.
Terra onde meus pais morreram, terra do orgulho dos peregrinos,
De qualquer lado da montanha, ouço o sino da liberdade!”
E se a América é uma grande nação, isto tem que se tornar verdadeiro.
E assim ouvirei o sino da liberdade no extraordinário topo da montanha de New Hampshire.
Ouvirei o sino da liberdade nas poderosas montanhas poderosas de Nova York
Ouvirei o sino da liberdade nos engrandecidos Alleghenies da Pennsylvania.
Ouvirei o sino da liberdade nas montanhas cobertas de neve Rockies do Colorado.
Ouvirei o sino da liberdade nas ladeiras curvas da Califórnia.
Mas não é só isso. Ouvirei o sino da liberdade na Montanha de Pedra da Geórgia.
Ouvirei o sino da liberdade na Montanha de Vigilância do Tennessee.
Ouvirei o sino da liberdade em todas as colinas do Mississipi.
Em todas as montanhas, ouviu o sino da liberdade.
E quando isto acontecer, quando nós permitimos o sino da liberdade soar, quando nós deixarmos ele soar em toda moradia e todo vilarejo, em todo estado e em toda cidade, nós poderemos acelerar aquele dia quando todas as crianças de Deus, homens pretos e homens brancos, judeus e gentios, protestantes e católicos, poderão unir mãos e cantar nas palavras do velho espiritual negro: “Livre afinal, livre afinal”. Agradeço ao Deus todo-poderoso, nós somos livres afinal.”
(Encontrado em www.joildo.net/artigos)