Boas Vindas!!

MOJUBÁ !
Temos o intuito de incentivar e discultir textos sobre as religiões de matriz africana entre outras questões que envolve essa temática, também ter um espaço para divulgação da atividades da Egbé que alcança o Ilê Axé Sangó e o Centro Cultural Ébano Brasil.

quinta-feira, 30 de junho de 2011

A EGBÉ ESTÁ EM FESTA

Babálòórisá João Bosco D’Sangó

     Este mês a Egbé Òní Omorisá Sangó e Associação Cultural Ébano Brasil comemora um ano de existência, como ainda um ano de sacerdócio do Babalòorisá João Bosco d’ Sangó, líder desta Ilé Asé, e um ano de iniciação de Iandra Moraes d’Osun, Hungbona da Casa de Sangó.
     Foi um ano de intensas atividades para todos/as que fazem parte desta família, afinal manter uma Ilê Asé em funcionamento em uma cidade como Cuiabá, que é profundamente preconceituosa, na qual a intolerância religiosa está presente, se torna desafiador. Porém, na crença de que tudo que fazemos, fazemos graças a Olodumare e aos Orisás, procuramos fazer o melhor. Afinal, nada fazemos em nosso nome e sim pelos e para os Orisás, como também por manter viva e dinâmica uma cultura que com a diáspora negra para as Américas, está presente em nosso país, porém é profundamente mal interpretada não só em Cuiabá, mas em todo Brasil.
     Entretanto, desanimar não faz parte de nós, afrodescendentes. A exemplo de nossos antepassados que jamais baixaram a cabeça, hoje somos nós que devemos nos empenhar na preservação dessa cultura milenar.
     A luta por uma sociedade que respeite as diversas formas de crer e louvar, deve fazer parte de todos/as nós que acreditamos que negros e afrobrasileiros contribuíram e contribuem para a formação sócio-cultural desta imensa nação. Especialmente em se tratando de religiões e religiosos/as de matriz africana.
     É inegável que a sociedade brasileira tem uma dívida monstruosa com todos/as aqueles/as que com força, garra, persistência e singularidade, de tudo fizeram e continuam fazendo para edificar o Brasil.  
     Em se tratando da Egbé Òní Omorisá Sangó e Associação Cultural Ébano Brasil é inegável que foi um ano de muita luta e persistência, pois muito já fizemos, porém tem-se muito ainda por fazer. Cremos que com a ajuda de Olodumare e sua corte de Orisás faremos o melhor para o bom desenvolvimento da mesma.
   No primeiro dia deste mês comemoraremos o aniversário natalício
da Yarobá Ângela d’ Osun.  Pessoa que tem um papel de profunda relevância nesta Egbé, por isso rogamos a todos/as Orisás que lhe dê vida longa com muita saúde, sucesso profissional e amoroso. Que Osún esteja sempre presente em todos os momentos de sua vida. Harmonia, equilíbrio, paz, prosperidade, asé e muitas alegrias na vida é o que nós lhe desejamos.
     Neste mês continuaremos apresentando mais um capítulo da obra da pesquisadora Ronilda Iyakemi Ribeiro, Alma Africana no Brasil- Os ioruba. Trazemos o capítulo 07 que se intitula: Noção de Pessoa: Concepção Iorubá de Natureza e Destino Humano. Esse texto nos evidencia o significado teológico de Asé entre os yorubás, bem como a noção de destino e a importância do oráculo de Ifá para esse povo.
       Já no segundo texto o Bábáòlòòrisa da Ègbé Òmó Oní Odé, em Campo Grande, Edson Fernandes enfatiza a importância da escolha de sacerdotes e sacerdotisas com boa formação religiosa para não haver arrependimentos futuros. Visto que, a má escolha poderá em tempo vindouro ocasionar descrédito na religião da qual o fiel escolheu para sua vida. O mesmo ressalta que a fé sem conhecimento se torna algo alienante.
A lenda do mês explica o porquê que os omorisás Sangó não devem comer carne suína.
             Com referência ao calendário de atividades da Egbé Òní Omorisá Sangó deste mês destacamos: 

 Dia 02 de julho (Sábado) das 15 às 17 horas – Atendimento Público;
 Dia 09 de julho – Participação de Festa em Honra a Babá Orisá Sangó e Ya Orisá Oyà na Egbé Òmó Òní Odé – Campo Grande – MS;
 Dia 16 de julho - (Sábado) das 15 às 17 horas – Projeto Discutindo Candomblé Ketú.
 Dia 23 de julho - (Sábado) das 15 às 17 horas - Projeto Discutindo Candomblé Ketu;
Dia 30 de julho – (Sábado) Festa em Honra a Babá Orisá Sangó; Comemoração de um ano da Egbé Òní Omorisá Sangó e do CENTRO Cultural Ébano Brasil; Obrigação de um ano de Iandra d’Osun (Hungbona)

Desejamos a todos/as um mês de alegria, sucesso e harmonia, e que os artigos deste postados sirva para o crescimento pessoal de cada um e cada uma que lerem e refletirem sobre os mesmo.
Abraços Fraternos

NOÇÃO DE PESSOA: CONCEPÇÃO IORUBÁ DE NATUREZA E DESTINO HUMANOS

  
Por Ronilda Iyakemi Ribeiro

A respeito do axé
Para discorrer a respeito da natureza e destino humanos é interessante iniciar esclarecendo o significado de axé, nome dado pelos iorubás à força vital. Segundo Maupoil (citado por E. dos Santos, 1986) axé é a força invisível, a força mágico-sagrada de toda divindade, de todo ser animado, de toda coisa. Não aparece espontaneamente. Precisa ser transmitida. Qualquer chance de realização na existência depende do axé que, enquanto força, obedece a algumas leis: (1) é absorvível, desgastável, elaborável e acumulável; (2) é transmissível através de certos elementos materiais, de certas substâncias; (3) uma vez transferido por essas substâncias a seres e objetos, neles mantém e renova o poder de realização; (4) pode ser aplicado a diversas finalidades; (5) sua qualidade varia segundo a combinação de elementos que o constituem e que são, por sua vez, portadores de uma determinada carga, de uma particular energia e de um particular poder de realização. O axé dos orixás, por exemplo, é realimentado através de oferendas e de ação ritual, transmitido por intermédio da iniciação e ativado pela conduta individual e ritual; (6) pode diminuir ou aumentar.
O axé encontra-se numa grande variedade de elementos do reino animal, vegetal e mineral. Encontra-se em elementos da água doce e salgada e da terra. Acha-se contido nas substâncias essenciais de seres animados ou não. Elbein dos Santos (1986) apresenta uma classificação do axé em categorias: sangue vermelho, sangue branco e sangue preto. No reino animal o sangue vermelho compreende o sangue propriamente dito, animal e humano, aí incluído o fluxo menstrual; no reino vegetal, inclui o epo, azeite de dendê, o osun, pó vermelho extraído de pterocarpus erinacesses e o mel, sangue das flores. Quanto ao sangue branco, incluem-se, no reino animal, o hálito, o plasma, o sêmen, a saliva, o suor e outras secreções; no reino vegetal, a seiva, o sumo, o álcool e as bebidas brancas extraídas de palmeiras e de alguns vegetais, o ori, manteiga vegetal e o iyerosun, pó esbranquiçado extraído do irosun; no reino mineral, os sais, o giz, a prata, o chumbo, etc. O sangue preto compreende, no reino animal, as cinzas de animais; no vegetal, o sumo escuro de certas plantas, o ilu, índigo extraído de diferentes tipos de árvores, pó azul escuro chamado waji; no reino mineral, o carvão, ferro, etc.
Para poder atuar, o axé deve ser transmitido através de uma combinação particular que contém representações materiais e simbólicas do branco, do vermelho e do preto, do aiye e do orun, competindo ao oráculo a definição da composição necessária do axé a ser implantado ou restituído.
O sangue - animal, vegetal ou mineral - é substância indispensável para a restauração da força. Todo ritual, seja uma oferenda, um processo iniciativo ou uma consagração, realiza implante da força ou revitalização. O que vive, para poder realizar-se ou realizar, precisa de axé e, não sendo a fonte inesgotável, a reposição se faz necessária e é obtida através da prática ritual que reatualiza a força do tempo primordial, tempo da criação. A importância da regularidade dos ritos reside no fato de que a presença das entidades sobrenaturais é favorecida pela atividade ritual, ocasião privilegiada da transferência e redistribuição do axé.
Este, oriundo das mãos e do hálito dos mais antigos, na relação interpessoal, é recebido através do corpo e atinge níveis profundos, incluídos os da personalidade, através do sangue mineral, vegetal e animal das oferendas.

A respeito da natureza humana
A pergunta quem é o homem? tem por resposta: é a mais importante das criaturas de
Deus. Para os iorubás, ao Eu transcendental, intangível e invisível associam-se componentes de ordem material formando um corpo tangível e visível e outros componentes de ordem imaterial, intangível e invisível. O ser humano é descrito como constituído dos seguintes elementos: ara, ojiji, okan, emi e ori.
Ara, o corpo físico, constitui a casa ou templo dos demais componentes. Ojiji - o fantasma humano - é a representação visível da essência espiritual e acompanha o homem durante toda sua vida. Quando ara perece, ojiji também perece, embora somente ara seja enterrado. Ojiji pode ser traduzido por sombra. Okan, literalmente coração ou coração físico, intimamente conectado ao sangue, representa o okan imaterial, sede da inteligência, do pensamento e da ação. Emi, o princípio vital, associado à respiração, não se reduz a ela. É o sopro divino e, ao morrer o homem, diz-se que Emi partiu. Significa também, espírito ou ser. Uma das denominações de Deus é Elemii, Senhor dos Espíritos. Ori, a essência real do ser, guia e ajuda a pessoa desde antes do nascimento, durante toda a vida e após a morte.     O sentido literal de ori é cabeça física, símbolo da cabeça interior - ori inu. Deus é chamado também Oris e, fonte da qual originam-se os seres. Todo ori, embora criado bom, acha-se sujeito a mudanças. Feiticeiros, bruxas, homens maus e a própria conduta podem transformar negativamente um ori, sendo sinal dessa transformação uma cadeia interminável de infelicidades na vida de um homem a despeito de seus esforços para melhorar. O ori, entidade parcialmente independente, considerado uma divindade em si próprio, é cultuado entre outras divindades, recebendo oferendas e orações. Quando ori inu está bem, todo o ser do homem está em boas condições.

A respeito do destino humano

Recorrendo ao mito encontramos uma boa expressão das crenças iorubás a respeito do destino humano: Oxalá e Ijalá são as divindades modeladoras dos ori. Cada ser criado escolhe livremente o próprio ori e o próprio Odu - signo regente de seu destino. Ijalá, embora notável em sua habilidade, não é muito responsável e, por isso, muitas vezes modela cabeças defeituosas: pode esquecer de colocar alguns acabamentos ou detalhes necessários, como pode, ao levá-las ao forno para queimar, deixá-las por tempo demasiado ou insuficiente. Tais cabeças tornam-se, assim, potencialmente fracas, incapazes de empreender a longa jornada para a terra, sem prejuízos. Se, desafortunadamente, um homem escolhe uma dessas cabeças mal modeladas, estará destinado a fracassar na vida. Durante sua jornada para a terra, a cabeça que permaneceu por tempo insuficiente ou demasiado no forno, poderá não resistir à ação de uma chuva forte e chegará mais danificada ainda. Todo o esforço empreendido para obter sucesso na vida terrena terá grande parte de seus efeitos desviada para reparar tais estragos. Pelo contrário, se um homem tem a sorte de escolher uma das cabeças realmente boas, tornar-se-á próspero e bem sucedido na terra, uma vez que sua cabeça chega intacta e seus esforços redundam em construção real de tudo aquilo que se proponha a realizar. O trabalho árduo trará ao homem afortunado em sua escolha, excelentes resultados, já que nada é necessário dispender para reparar a própria cabeça. Assim, para usufruir o sucesso potencial que a escolha de um bom ori acarreta, o homem deve trabalhar arduamente. Aqueles, entretanto, que escolheram um mau ori têm poucas esperanças de progresso, ainda que passem o tempo todo se esforçando.
A forma ou tamanho de uma cabeça nada informa a respeito de suas potencialidades. Como saber se a escolha feita foi boa ou má? Pode um homem conhecer as potencialidades da própria cabeça ou da cabeça de outrem? Os fundamentos para a resposta a essa pergunta, encontram-se em outro mito: Ao atravessar o portal que conduz do céu à terra, o porteiro do céu - Onibode orun, pede ao homem que declare seu destino. Este é então selado e, embora a lembrança disso se apague no homem, Ori retém integralmente a memória de tudo. Baseado nesse conhecimento guia seus passos na terra. A única testemunha do encontro entre Ori e Onibode orun é Orumilá, uma das divindades primordiais, o deus da sabedoria. Por isso Orumilá conhece todos os destinos humanos e procura ajudar os homens a trilhar seus verdadeiros caminhos. Nos momentos de crise, a consulta ao oráculo de Ifá permite acesso a instruções a respeito dos procedimentos desejáveis, sendo considerados bons procedimentos os que não entram em desacordo com os propósitos do ori. Ifá é outro nome de Orumilá.
A respeito do ori, resta ainda lembrar que trata-se de uma divindade pessoal, a mais interessada de todas no bem-estar de seu devoto. Se o ori de um homem não simpatiza com sua causa, nada poderá ser feito por outra divindade. Assim, o que ori não sanciona, não pode ser concedido nem por Olodumare, nem pelos orixás. Alguns poemas divinatórios de Ifá, registrados por Abimbola (1976), dizem:
Somente o Ori é quem pode seguir seu devoto a qualquer parte sem retornar. Se tenho dinheiro, renderei graças a meu Ori. Se tenho crianças na terra, é a meu Ori que devo render graças. Por todas as boas coisas que tenho na terra Deverei render graças a meu Ori. Ori, eu o saúdo! Você que não esquece seus devotos, Que os abençoa mais rapidamente que as outras divindades. Nenhuma divindade abençoa um homem sem o consentimento de seu Ori. Ori, eu o saúdo. Você que possibilita que as crianças nasçam vivas. Uma pessoa cujo sacrifício é aceito por seu Ori deve exultar imensamente. Verdadeiramente, todos os desejos de meu coração revelarei a meu Ori. O Ori de um homem é seu simpatizante.  Meu Ori, salva-me! Você é meu simpatizante!
Muitas referências são feitas às relações entre o ori e o destino pessoal. O destino, descrito como ipin ori - a sina do ori - pode sofrer alterações em decorrência da ação de pessoas más chamadas omo araye - filhos do mundo, também chamadas aye - o mundo ou ainda, elenini - implacáveis (amargos, sádicos, inexoráveis) inimigos das pessoas. Entre estes encontram-se as aje - bruxas, os oso - feiticeiros, os envenenadores e todos aqueles que se dedicam a práticas malignas com o intuito de estragar qualquer oportunidade de sucesso humano. Se seu inhame é branco, cubra-o com a mão enquanto come porque Aje não quer que ninguém prospere. O bem-estar e os sucessos devem ser escondidos dos olhares para não tornarem-se alvo de ataques malignos.
O destino também pode ser afetado, de modo adverso, pelo caráter da própria pessoa. Um bom destino deve ser sustentado por um bom caráter. Este é como uma divindade: se bem cultuado concede sua proteção. Assim, o destino humano pode ser arruinado pela ação do homem. Iwa re laye yii ni yoo da o lejo - Seu caráter, na terra, proferirá sentença contra você.
Sendo estes os pressupostos, retomamos as perguntas: como saber se a escolha do próprio ori foi boa ou má? Pode um homem conhecer as potencialidades da própria cabeça ou da cabeça de outrem? O jogo divinatório de Ifá possibilita que a pessoa tome conhecimento dos desígnios do próprio ori, saiba a respeito do orixá ou irunmale que deve ser cultuado e conheça seus ewo - proibições quanto ao consumo de alimentos, uso de cores e condutas morais.
As divindades, incluindo Orumilá, fazem uso de recursos divinatórios para conhecer os desejos do próprio ori. Suas vidas, também regidas por seus ori beneficiam-se da consulta a Ifá. É através de Orumilá, o porta-voz dos orixás, que se pode conhecer os desejos das divindades, incluindo-se entre elas, a divindade pessoal - o ori. Enquanto porta-voz do ori, Orumilá é considerado eleri ipin - testemunha da escolha humana de destino. Considera-se vital para todo homem recorrer a Ifá, sistema divinatório de consulta a Orumilá, a intervalos regulares, para tomar conhecimento do que agrada ou desagrada o próprio ori. Enquanto intermediário entre a pessoa e as divindades (entre as quais o próprio ori), Ifá não apenas informa sobre os desejos divinos mas também conduz os sacrifícios ofertados às divindades para que estas possam cumprir seu papel: ajudar os ori a conduzirem as pessoas à realização do próprio destino. O mesmo é válido para os orixás, ou seja, as divindades encontram-se, como os homens, em processo de evolução e necessitam de orientação superior para prosseguirem em seu caminho.
Como se crê que o ori dos pais traz boa fortuna aos filhos, é comum a recomendação do oráculo no sentido de que sejam feitas ofertas sacrificiais ao ori dos pais e estes, ao orarem pelos filhos, apelam ao próprio ori: Ori mi a sin o lo - Possa meu ori ir com você ou Possa meu ori guiá-lo e abençoá-lo. Analogamente, o ori de uma pessoa tem condições de proteger, ajudar ou, ainda, prejudicar outras pessoas.
O recurso divinatório de Ifá, associado ao culto de Orumilá, é o mais desenvolvido dos sistemas divinatórios iorubás. Fazendo uso do obi de quatro partes, do opele, de areia, água, búzios, ikin, etc. Ao ser feita a consulta ao oráculo de Ifá, a queda dos dezesseis frutos de palmeira chamados ikin ou do opele, a corrente divinatória, define determinada configuração.
De 16 figuras básicas e 256 derivadas chamadas Odu, decorrem 4096 variantes possíveis, cada qual com seu nome. A cada configuração corresponde uma série de parábolas, significativamente coincidentes (sincrônicas) com a circunstância existencial do consulente. A conduta do(s) herói(s) da parábola, sugere o procedimento adequado para a superação da crise e realização do próprio destino. (RIBEIRO, Ronilda Iyakemi. Alma Africana no Brasil- Os iorubas. Salvador-BA, Ed. Oduduwa,1996.p. 51 a 56)

FÉ SEM CONHECIMENTO


Por Bábáòlòòrisa Edson Fernandes*

      Até onde pode ir nossa fé? Porque tantas pessoas abandonam a crença nos Orisàs e buscam outras crenças? Será que a fé nos Orisàs tem sido pequena? Ou as desilusões na religião dos Orisàs que são grandes demais? Onde podemos buscar a razão para tudo isso? Será que é o Orisà que esta errando ou, o erro está sendo cometido pelo pouco conhecimento de nossos sacerdotes e nossas sacerdotisas? 
       São essas questões que busco refletir neste começo de conversa com as pessoas que lêem este artigo iniciada ou não na religião dos Orisàs.
     Tantas coisas vêm sendo criadas no culto aos Orisàs, outras tantas misturadas ao Candomblé. Dessa maneira a verdadeira essência do Orisà fica cada dia mais longe da sua real origem.
    Tentemos enxergar as coisas de uma forma singular: Se pegarmos uma receita e ao invés do sal, colocarmos o açúcar, todo seu sabor será mudado e a receita original perderá completamente o sabor.
         Surge então uma indagação: Quem errou?
      É difícil compreender como algumas pessoas conseguem cultuar Inkices, Voduns, Orisàs, Caboclos e tantas outras Divindades juntas em um mesmo templo?
     Tenho notícias de pessoas iniciadas no Culto dos Orisàs para Osun, tendo como Esù pessoal Tranca Rua das Almas. Como pode isso acontecer, visto que existem incompatibilidades entre essas energias?
    Se não tivermos nas religiões afrobrasileiras sacerdotes e sacerdotisas bem preparados/as e com uma linha de formação bem definida, não teremos como esperar um resultado satisfatório nos cultos aos ancestrais divinizados.
    Talvez nesse fato esteja a explicação para a desistência das pessoas dos cultos afros. A de se perguntar ainda: Onde está sendo depositada toda a fé das pessoas? Para quem elas devem fazer suas orações? Em qual cultura ela deve se aprofundar e aprender? É na prática do misturando tudo que funcionará? Compreendo que não. O acerto ocorre através da escolha de um bom sacerdote ou sacerdotisa, do qual ter-se-á o conhecimento e a formação necessária para compreender a religião do culto que o mesmo foi iniciado.
      As más escolhas com o passar do tempo, conduzem a mais erros que acarretam perdas e, com elas os sofrimentos. Por isso, as mazelas pessoais e os descréditos com as religiões afro seguem aumentando.
       Tudo na vida está interligado, não vamos esperar milagres, mas vamos buscar sacerdotes e/ou sacerdotisas melhores e mais preparados/as, que possam orientar com mais contundência seus filhos/as. Não esperar por mágica, mas coerência cumprimento das obrigações e responsabilidades com os Orisàs.
      As respostas para todas as questões estão em nós mesmos. Quando temos fé, sentimos que não estamos sozinhos, que uma força existe dentro de nós, mas às vezes não podemos dar um nome a ela, sentimos sua presença. É por isso que precisamos desenvolver um maior conhecimento, sobretudo o que está acontecendo conosco.
       Sabemos que muitas vezes o sentimento de força e fé que nos sustenta partiu de um determinado orisà e  às vezes de um assentamento feito por um sacerdote e/ou sacerdotisa que  detêm conhecimentos e através dele/a nos transmite o asé necessário para o momento ou situação que estamos passando.
        É somente quando existe esse conjunto de forças organizadas, que teremos o resultado necessário, para o problema daquele momento. A crença é necessária, em todos os momentos. Precisamos acreditar e também conhecer o que acreditamos. Fé sem conhecimento é alienação.
*Edson Fernandes é bábáòlòòrisa no município de Campo Grande-MS, dirige a Egbé Òmó Òní Odé. Coordena o Centro Afro Cultural Baobá.

LENDA DO MÊS:

Xangô deixa de comer carne de porco em honra dos malês 


   Todas as nações tinham Xangô como rei, menos os malês, que são muçulmanos.
    Um dia, Xangô foi até a cidade deles para levar alguém de sua família. Mas o malês não o aceitaram, porque entre eles só vivia quem tivesse o mesmo sangue deles.
    Xangô não gostou nada daquilo. Por todas as partes ele havia deixado gente sua, só os malês não aceitaram.
    Então Xangô voltou para casa e contou a Yansã o que acontecera. Ele chamou para fazerem guerra aos malês e ela concordou prontamente.
    Eles partiram no dia seguinte, Yansã na frente. Ia imensa, colossal, completamente coberta de fogo, soltando relâmpago em todas as direções. Xangô foi atrás, espalhando coriscos à sua volta.
    A terra e todas as outras coisas tremiam e os coriscos de Xangô causavam destruição entre os malês. Eles pensaram que era o fim do mundo, viram Yansã lançando todo o seu poder, mas também viram Xangô e entenderam o que estava acontecendo.
    Xangô chegava para dominar. Os malês, então, imploraram pelo fim do suplício. Xangô exigiu que eles se submetessem ao seu poder. Com muito medo da destruição, os malês aceitaram o poder de Xangô e abriram a porta da cidade para que entrasse quem fosse da sua vontade.
    Assim, Xangô também é rei na cidade dos malês. Só que em homenagem a esse povo muçulmano Xangô deixou de comer carne de porco, tão grande era seu desejo de ser respeitado por essa nação. É por isso que todos os filhos e filhas de Xangô também não devem comer carne de porco. (PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos Orixás. Cia das Letras, 2000. p.274-275)